quinta-feira, 27 de novembro de 2008



HORÁRIO DE VERÃO


Há 28 anos, eu me confundo quando chega o horário de verão! Nunca sei o que fazer com o ponteiro. Minha avó mudava o relógio com dias de antecedência, pra dar tempo de errar ou consertar. Ela não tinha nada pra fazer naquele fim de vida, naquele fim de mundo mas morria de medo de perder a hora! Discutia com minha tia-bisavó, horas a fio, até a chegada de um terceiro que balizasse a questão, mas este nunca tinha muita certeza de nada. A entrada do horário de verão, este ano, me fez perceber que eu já não estou na primavera dos meus dias. É a inquietação em controlar o tempo, coisa inédita para mim. Antes eu vivia atrasada, mas nunca estava com pressa. Hoje eu até que sou pontual, mas tudo na minha vida é sôfrego. Deve ser coisa da maternidade!

Na sexta-feira do feriado passei o dia de maiô na piscina com o Francisco, meu filho. O pai dele estava de sunga -mais um indício inquestionável do passar dos anos! Como diziam os meus colegas de escola, homem tem direito de usar sunga até os 13 e depois dos 31. No meio tempo, fica ridículo. E maiô inteiro então? Imagino o Francisco no futuro, num hit do Premê: “O meu pai de sunga minha mãe de maiô”!

No dia seguinte, pela segunda vez, desde que o Francisco nasceu, deixei ele na casa da avó e fui pra balada. Era casamento da Jacqueline, que é judia e árabe, com o Leandro, que é baiano!. Até o Pai de Santo estava lá. Mas era o Pai de Santo da Flávia, que além de judia e árabe, é espírita, budista, daimista... enfim, um culto ecumênico! O jantar demorou pra sair por causa da dança do ventre, e o pai Cidão, que já está velhinho, ficou de mau humor e pegou um taxi. Eu também estava com fome, mas não fiquei de mau humor, e com isso, ganhei uns anos de juventude.

Depois de umas e outras, o pai da noiva foi fazer graça com as dançarinas do ventre com cara de “eu tô pagando”. As filhas se embolavam entre as bailarinas, pra segurar a onda do pai. O irmão mais velho passava com um copo de whiskie na mão direita e de caipirinha de saquê na mão esquerda com cara de “meu pai tá pagando”, até que chegou a primeira dama. Mãe de noiva sempre impõe respeito, sobretudo se ela é árabe e judia. Mas a mãe da Flávia chegou batendo palmas, e ali permaneceu, aplaudindo, de longe, do lado da tia Suzete e da Tia Lili - que pelo avançado da idade, nem levantaram da cadeira. Enquanto isso, a Flávia arrebentava. Porque além de tudo o que eu já falei, a Flávia também é dançarina, e quando dança, (coisa que acontece o tempo inteiro!) não tem pra ninguém. Nem pras dançarinas do ventre! A Flávia dança no trabalho, no elevador, no meio da rua, no meio da sala. É uma dessas pessoas que consegue ser engraçada até na fotografia.

Ligeiramente ébrea que olhei pro relógio e achei que fossem 3 horas da manhã no horário biológico do Francisco. Em cinco minutos consegui deixar o pai dele tão paranóico quanto eu, e nos preparamos pra uma saída à belga- aquela que é mais que francesa! No caminho, ouvindo uma música de nove minutos do Renato Russo, percebi que pela vigésima oitava vez, eu me confundi. Era uma hora antes no horário biológico do Francisco! E ninguém estava atrasado demais...

Ao tirar a maquiagem usando os demaquilantes da minha sogra, (eu que sempre lavei a cara com sabão), percebi algumas rugas salientes na região dos olhos. Lavava o rosto com produto importado, sentindo-me ligeiramente ébrea, cantarolando a música de nove minutos cuja letra eu sei de cór desde os nove anos de idade, percebendo o passar dos anos, e a sabedoria resignada da mãe da Flávia, que aplaudia as estripulias do marido que pagou pela festa. É preciso saber envelhecer com dignidade. Mas eu bem que preferia envelhecer mais gostosa que a dançarina do ventre!







PORQUE EU CRIEI ESTE BLOG

A iniciativa desse blog surgiu por dois fenômenos: o primeiro é chamado second-life. O segundo é o fenômeno das pessoas, que quase como jargão, teimam em repetir “minha vida é uma merda”. Os dois fenômenos me parecem aberrações! O primeiro, chamado second-life,conheço mais ou menos: criei um avatar chamado Galadriel Garfunkel -para bons conhecedores de Lord of the Rings- mas foi só pra poder acompanhar o trampo de um primo meu que anda ganhando dinheiro virtual. O segundo me choca tanto quanto o primeiro. Gerei uma nova vida e mesmo sabendo que todos nascemos da mesma maneira, me sentia portadora de um milagre
É por achar minha vida bem legal, aliás, bem mais legal que a vida da Flora e da Donatella, por ter uma idéia meio nebulosa de Deus, e por ser um expertise em novelas (assistia até o Vale a Pena ver de Novo quando estava de licença meternidade) que criei Minha Vida é uma Novela!

Todas as histórias aqui registradas são verdadeiras e qualquer conexão com a ficção é mera coincidência. O fato é que todas as minhas amigas, diga-se bem, TODAS AS MINHAS AMIGAS são um perfil em busca de um autor. E tem até aquelas que se alguém inventasse, a crítica especializada diria: “O autor carregou a mão na construção desse personagem! Que exagero”. Pois é!

Os absurdos são privilégios da realidade. Transformados em literatura, perdem verossimilhança. Lá vai um exemplo didático: Se na vida real, nevar na Amazônia, nevou na Amazônia e ponto! Fazer o quê? Os cientistas vão buscar explanações, o Al Gore vai ganhar mais dinheiro e todo mundo vai achar que o mundo está virado, mas ninguém vai questionar o curso da vida ou do universo. Mas, se por outro lado, nevar numa Amazônia literária, das duas uma: ou ninguém avança na narrativa por falta de coerência, ou, em constando estes preceitos que segundo Bakhtin são básicos para uma boa literatura, o texto será tachado de ficção científica! Assim sendo, inauguro meu blog que fala sobre a minha vida como ela é: elementar, divertida e cheia de personagens ilustres! Um deles é você - afinal, duvido que algum leitor desavisado navegue por aqui, se não for amigo meu!