Do lado da sauna gay tem o puteiro. Do lado do puteiro tem o Ó. Você para diante da janela e olha. Se tiverem quatro gostosas você entra. Tem duas. E meia dúzia mal dormidas. Você entra mesmo assim. É destratado pelo segurança, não arruma lugar pra sentar, fica de pé entre os passistas, que dançam samba como antes se dançava forró. Mas você não vai embora. Porque pode ser que algo aconteça, que alguém tropece, que alguém perceba que tem gentileza na tua torpeza. Quando você começa a suspeitar que bebeu demais, tem fila pra pagar a conta, tem fila pro banheiro e o banheiro é unissex. Você para, braço cruzado, estilo blazê, só fitando a mulherada. Um cara entra e mija de porta aberta. Uma mina entra atrás, e fecha a porta. Eles demoram. Você desconfia. Ele sai na frente. Ela sai depois, gargalhando. E se fosse a mulher da tua vida, aquela devassa que entrou no banheiro? Não é.
Tuas costas doem e você nunca soube sambar. Começa a sentir o chocalho fatídico dos ossos, o fígado que vai se revoltar de manhã. Mas ainda é madrugada e de quem é essa voz pentelha a te aconselhar pelo muro do cemitério?
Ai então que você entra, rapaz, no cemitério de noite, como um delinqüente, como um merda dum maconheiro sem nada em cima, só porque você é bem louco. Você chapa numa tumba de mármore só porque tem um camafeu com o rosto de uma mina que morreu em 1923. Você acha que não existiam minas em 1923. Mas elas existiram.
As ruas tem letras. O cemitério é um grande camping de mausoléus ostensivos que te fazem lembrar que a Vila Madalena são os burgos. Se você tivesse crédito, mandava um torpedo pra ela, mas o teu descrédito não tem precedentes. Ela batia com a mãozinha histérica na buzina pra você sair da frente do carro porque você tava bêbado demais pra deixar a mulher da tua vida ir embora guiando o teu carro. E você perdeu a mulher, e o carro, e ainda vai ter que pagar pensão.
Quando tem estrela na noite paulistana é Venus. Alguém te disse isso e você nunca duvidou. Assim como você acreditou que azeite, quando esquenta, vira gordura trans, ou que no Butão tem qualidade de vida. Você verificou, por acaso, pra sair por ai dizendo essas coisas? Não verificou. Tua tese te dá vergonha. Você disfarça. Vai dizer que não dá?
Tem noites, meu velho, que era melhor ter entrado no puteiro!
Um comentário:
grande estilo, alguma coisa interessante acontece
no unlover roots.
E o Xavier e as criança estão bem?
abçs
Zé Fernando
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